quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Crítica - Sunset Park


Título: Sunset Park
Autor: Paul Auster
Tradutor: José Vieira de Lima
Editora: ASA
Nº de Páginas: 230
Preço Editor: 16,00€

Sinopse: «Durante os meses sombrios do colapso económico de 2008, quatro jovens ocupam ilegalmente uma casa abandonada em Sunset Park, um bairro perigoso de Brooklyn. Bing, o cabecilha, toca bateria e dirige o Hospital das Coisas Escangalhadas, onde conserta relíquias de um passado mais próspero. Ellen, uma artista melancólica, é assaltada por visões eróticas. Alice está a fazer uma tese sobre a forma como a cultura popular encarava o sexo no pós-guerra. Miles vive consumido por uma culpa que o leva a cortar todos os laços familiares. Em comum têm a busca por coerência, beleza e contacto humano. São quatro vidas que Paul Auster entrelaça em tantas outras para criar uma complexa teia de relações humanas, num romance sobre a América contemporânea e os seus fantasmas.»


Apresento-vos Paul Auster, na forma de um dos livros com melhor trabalho de edição dos que li este ano. E este é só o primeiro de uma longa lista de elogios que vão ler nesta minha crítica. Posso não conseguir garantir-vos que vão gostar tanto de o ler como eu, mas uma coisa é certa: este livro foi, para mim, a leitura certa neste preciso instante. Quando um livro entra na nossa vida, inesperadamente, no momento e no espaço certo, é já à partida um campeão. Sunset Park é um romance urbano, em todos os sentidos; lido precisamente na fase da minha vida em que exploro todo o espírito de uma cidade viva e dinâmica. É um romance sobre as desilusões e as expectativas dos jovens; e de que têm sido compostos os meus últimos meses senão precisamente destas sensações? O livro estava há já um ano na minha estante, mas os acasos guardam-nos estas coisas.

Este é um dos autores que eu, mesmo antes de ler, já sei que vou gostar. Resultado de preconceitos, provavelmente. Já referi a questão do grafismo - a ASA tem vindo a renovar as capas dos livros de Auster, e, na minha opinião, a linha é excelente. Depois, a sinopse. Remeteu-me de imediato, logo que saiu para as livrarias, para uma série de conceitos que associo a boas experiências de leitura. Uma cidade, pessoas à deriva nesse espaço. E, na capa, nas letras pequeninas que divulgam a crítica do Booklist, um destaque para a expressão caracterizadora do romance: 'a miraculosa estranheza de se estar vivo'.

Posso começar já por essa frase. Não num sentido particular, e sim olhando para a generalidade das ideias com que Auster nos presenteia ao longo da obra. Muitas vezes seguindo por caminhos menos convencionais, leva-nos a reflectir um pouco na nossa própria condição. Eu sei que pode parecer um lugar comum, um estereótipo, mas acreditem que não se trata de nada disso. Desde uma série de páginas seguidas em que nos apresenta a história dos jogadores de basebol mais peculiares, até às descrições embaraçosas dos «desenhos científicos» de Ellen com inspiração nos corpos humanos com que se cruza na rua, passando pelas extensas dissertações sobre o filme Os Melhores Anos das Nossas Vidas - filme de 1946, da América do pós-guerra, e cujo título parece ironizar por si só todo o conteúdo deste livro.

A estrutura do romance forma uma teia de personagens que conhecemos num período relativamente curto de tempo. E com as quais simpatizamos num ápice. Cada umas das pessoas sobre as quais este livro se debruça vivem sobre a acção de um sofrimento. Sofrimento camuflado por conformismo. E esta emoção está presente desde a primeira frase - "Há cerca de um ano que ele fotografa coisas abandonadas" sugere algo nesse sentido, não é? - até à última. A melancolia do falhanço e do arrependimento constante, de quem se passeia pela vida sentindo que não é feliz, é o ar que se respira na leitura. Nova Iorque debaixo de um céu azul, mas com uma atmosfera carregada, Outono, Inverno e Primavera.

Foi o primeiro livro que li de Paul Auster. Ouvi há pouco tempo, vinda de uma pessoa que já leu muitos dele, que o autor «já era»! No sentido de que a sua obra se repete muito à volta dos mesmos temas, que se enrola na sua própria monotonia. É muito possível, diria até que é muito provável. Senti indícios disso à medida que ia lendo. Mas, como primeiro livro que li dele, a única coisa que tenho a dizer é que a leitura me emocionou e me colou completamente. Os sobressaltos ao longo do texto, nomeadamente o final algo inesperado para mim, vêm desiquilibrar a tal monotonia - não é suficiente para deixar de ser uma obra lenta,  remoída... mas gostei dela. Muito.

Uma opinião vinda de outra pessoa dizia-me que Paul Auster era o Murakami americano. Está lá a ideia. São diferentes, claro. Paul Auster é mais austero, mais pesado, mais terra-a-terra, mais deprimente, mais sufocante, aflitivo. Mas está lá também a fragância que os livros de Murakami deixam em mim quando os leio. A vida como acto contínuo. A vida e a estranheza de estarmos vivos. Como a certa altura uma das personagens do romance diz: qual é o sentido de duas pessoas fazerem amor e nove meses depois nascer mais uma pessoa no mundo, em ponto pequenino, mas com tanta potencial complexidade e totalidade como todas as outras? Obra incrível, Sunset Park não me deixou indiferente.

Nota (0/10): 9 - Excelente

Tiago

2 comentários:

Olinda Silva disse...

Esse livro ainda faz parte da pilha de livros "não lidos" que tenho cá em casa (juntamente com o «Da mão para a boca»). As boas críticas que me fizeram, juntamente com esta, estão a deixar-me com alguma curiosidade porque na realidade nunca li nada de Paul Auster.

susemad disse...

Ora aqui está um autor que tenho de voltar a ler... Apenas li "A trilogia de Nova Iorque".
Este "Sunset Park" parece-me bastante interessante. :)

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